Por Nieves Zúñiga, revisado por Gabriela Torres Mazuera, professora pesquisadora do Centro de Investigaciones y Estudios Superiores en Antropología Social (CIESAS - sigla em espanhol), e Pamela Durán-Díaz, pesquisadora da Universidade Tecnológica de Munique.
Berço do império asteca e do chocolate, os Estados Unidos Mexicanos cobrem uma área de 1.964.375 km2 [1]. Isto faz do México, como é popularmente conhecido, o terceiro maior país da América Latina.
A fronteira norte com os Estados Unidos faz dele um ponto de trânsito para migrantes latino-americanos em busca de uma vida melhor na América do Norte. No sul, compartilha com a Guatemala o legado cultural do império maia e com Belize, o Mar do Caribe.
Os <em>ejidos</em> são um tipo muito particular de propriedade fundiária no México que foi atualizada após a Revolução Mexicana. O <em>ejido</em> é definido como um núcleo populacional composto pelo conjunto de terras, florestas e águas de uma área, bem como o grupo de indivíduos detentores de direitos agrários.
Foto: Elias Almaguer/Unsplash
O México é o lar de pouco mais de 130 milhões de pessoas [2]. Destes, mais de 9 milhões vivem na capital, a Cidade do México [3]. De acordo com dados de 2020, 21% da população vive em comunidades rurais [4]. 15,1% (cerca de 17 milhões de pessoas) da população são indígenas que enriquecem a cultura mexicana com até 68 idiomas diferentes [5].
Um dos episódios mais conhecidos da história mexicana, a Revolução Mexicana liderada por Emiliana Zapata no sul do país e Pancho Villa no norte, aconteceu em parte sob o lema da luta agrária e da distribuição de terras. Isto resultou no atual predomínio de ejidos e comunidades agrárias - ambas formas de propriedade comunitária da terra - que caracterizam significativamente a governança fundiária no México até os dias de hoje.
Municipalidade de Teotihuacán, Estado do México, México. Foto: Anton Lukin (Licença Unsplash)
Legislação e regulamentação de terras
A Constituição de 1917 - emendada pela última vez em 2021 - prevê disposições detalhadas sobre terras e propriedades no México no artigo 27 [6]. Originalmente, a propriedade da terra e da água dentro do território nacional pertence à Nação, que tem o direito de transferir a propriedade a particulares, constituindo, assim, propriedade privada. As expropriações são permitidas desde que sejam de interesse público e mediante compensação. O mesmo artigo também estabelece os limites à propriedade privada quando enfatiza que a Nação terá sempre o direito de impor à propriedade privada as modalidades ditadas pelo interesse público e de regular o uso dos recursos naturais suscetíveis de apropriação para benefício social. O benefício social é entendido como a distribuição equitativa da riqueza pública, cuidando de sua conservação, alcançando o desenvolvimento equilibrado do país e a melhoria das condições de vida do conjunto da população. Entre as medidas possíveis a serem adotadas neste sentido estão a divisão de grandes propriedades - que são proibidas pela Constituição -, e prever, nos termos da lei reguladora, a organização e exploração coletiva de ejidos e comunidades, entre outras.
De acordo com a Constituição, as empresas comerciais podem possuir terras dedicadas a atividades agrícolas, pecuárias ou florestais maiores do que vinte e cinco vezes o tamanho de uma pequena propriedade.
A Constituição também reconhece a personalidade jurídica dos ejidos e comunidades agrárias, protege a propriedade fundiária e regula o uso da terra, florestas e água de acordo com a Lei Agrária. A Lei Agrária de 1992 reconhece os ejidos como proprietários das terras que foram dotados ou que de outra forma adquiriram (Art. 9). Também reconhece a capacidade das assembléias de ejido - a máxima autoridade e órgão decisório sobre a organização interna do ejido composto de todos os(as) ejidatarios(as) ou comuneros - de adotar a exploração coletiva das terras do ejido se assim for decidido pela assembléia (Art. 11). A assembleia ejidal também pode decidir, de acordo com a lei, sobre o uso de terras comuns, mudar o destino de tais terras, mudar o regime de propriedade e sobre a divisão da terra em propriedades privadas. Além disso, a Lei Agrária concede poderes às assembléias de ejido para autorizar os(as) ejidatarios(as) a mudar o regime legal dos lotes, tais como os ejidatarios(as) adotando a propriedade plena dos lotes delimitados e atribuídos a eles (Art. 81). Além disso, de acordo com a lei, os(as) proprietários(as) privados podem decidir tornar-se ejidatarios(as) (Art. 90) e os proprietários comunitários podem decidir tornar-se ejidatarios(as) (Art. 104).
Entretanto, alguns autores(as) apontam que o fim do processo de reforma agrária foi acompanhado pela modificação do sistema de propriedade de formas que não estão refletidas na legislação ou em mecanismos governamentais e legais [7]. Por exemplo, os ejidos e comunidades agrárias mudaram para formas que os afastaram de sua origem como formas de propriedade social: o ejido foi transformado em uma modalidade de propriedade privada e a comunidade agrária em um modelo de propriedade em si mesma [8].
Classificações de posse de terra
Os tipos de propriedade fundiária no México são: propriedade privada individual, chamada de pequena propriedade; ejidos e comunidades agrárias, ambas de propriedade comunitária e também chamadas de propriedades sociais ou núcleos agrários; baldíos, que são terras sem proprietários(as) formais; e terras nacionais, que são propriedade do Estado [9]. Baldíos e terras nacionais são indissociáveis e imprescritíveis (Direito Agrário, Art. 158).
De acordo com a Constituição, o tamanho das pequenas propriedades é limitado a um máximo de 100 hectares de terra irrigada ou seu equivalente em outros tipos de terra por indivíduo (Art. 27). O tamanho máximo do que é considerado uma pequena propriedade também varia de acordo com a cultura. Se a terra é dedicada ao cultivo do algodão e recebe irrigação, a área por indivíduo pode ser de no máximo 150 hectares. Se banana, cana de açúcar, café, henequen, borracha, palma, videira, oliveira, quina, baunilha, cacau, agave, nopal ou árvores frutíferas forem cultivadas, então a área pode ser de até 300 hectares (Art. 27).
Se uma pequena propriedade for utilizada para a pecuária, sua área máxima por indivíduo não poderá exceder a área necessária para manter até 500 cabeças de gado maior ou seu equivalente em gado menor de acordo com a capacidade forrageira da terra (Art. 27).
Os ejidos são um tipo muito particular de propriedade fundiária no México que foi atualizada após a Revolução Mexicana. O ejido é definido como um núcleo populacional composto pelo conjunto de terras, florestas e águas de uma área, bem como o grupo de indivíduos detentores de direitos agrários [10]. São terras de propriedade social nas quais diferentes tipos de propriedade individual e coletiva podem coexistir de forma regulamentada. Nenhum membro do ejido pode deter direitos de terra para mais de 5% da terra do núcleo ou para uma área maior que uma pequena propriedade (Lei Agrária, Art. 47). As florestas e selvas não podem ser propriedade individual (Lei Agrária, Art. 59). De acordo com a Lei Agrária, os ejidos funcionam com seus regulamentos internos e a exploração coletiva das terras ejidales pode ser adotada quando a assembleia assim o decidir (Art. 11).
Tanto os ejidos como as comunidades agrárias têm suas origens nos chamados pueblos de índios da época colonial, adquirindo seu nome atual com a reforma agrária, embora atualmente não haja relação direta entre tipo de propriedade e identidade étnica [11]. A diferença entre os dois reside no procedimento pelo qual a posse ou desapropriação da terra poderia ou não ser demonstrada [12].Assim como os ejidos, as comunidades são formadas por toda a terra, florestas e água, e as pessoas que nelas vivem compartilhando tradições, usos e costumes. Outra diferença entre ejidos e comunidades é que as terras comunitárias são inalienáveis (Art. 99). Além disso, nas comunidades, as parcelas agrícolas não podem ser tituladas individualmente e os(as) agricultores(as) comunitários(as) não podem vender suas terras [13].Para acessar esses direitos, a comunidade agrária pode ser transformada em um ejido, se assim for decidido pela assembleia. De acordo com dados oficiais, obtidos através de um pedido de informações à Procuraduría Agrária, apenas 15 núcleos agrários mudaram o regime de propriedade, seja de ejido para comunal ou de comunal para ejido entre 1992 e 2020. De acordo com os últimos dados disponíveis de 2007 [14], às propriedades sociais ocupavam 53,4% da superfície nacional, o equivalente a 84,5 milhões de hectares para os ejidos e 17,4 milhões de hectares para as comunidades agrárias [15]. A propriedade privada ocupa 39,8% do solo e as propriedades nacionais 7,7% [16].
A mudança de regime de ejido para comunidade e vice-versa é possível seguindo os regulamentos e nas assembléias correspondentes. Uma vez aprovada a transformação, ela deve ser registrada como tal no Registro Nacional Agrário para que a mudança seja legal (Lei Agrária, Art. 103 e 104). Entretanto, é mais frequente hoje em dia a mudança para a propriedade plena da propriedade ejidal.
Dentro das comunidades ejidales e agrárias existem diferentes tipos de posse de terra. Os ejidatarios(as) e comuneros(as) têm direito a lotes de cultivo e acesso a terras comuns, que não são áreas atribuídas individualmente, cujo domínio só pode ser exercido coletivamente pela assembléia do núcleo agrário e são compostas de terras de assentamento humano, terras de uso comum e lotes com destino específico (por exemplo, a unidade agrícola industrial da mulher camponesa, ou a unidade produtiva para o desenvolvimento integral da juventude); os(as) proprietários(as) só podem ter acesso a parcelas para trabalhar; e os(as) avecindados são mexicanos residentes no núcleo agrário por pelo menos um ano, que podem se tornar ejidatarios e ter o direito de comprar terras no ejido [17].
De acordo com a Lei Agrária, os ejidos devem registrar seu regulamento interno no Registro Nacional Agrário. No nível interno, os ejidos têm autoridade para delimitar as terras dentro deles usando as normas técnicas emitidas pelo Registro Nacional Agrário e a autoridade para decidir e regular seu uso (Lei Agrária, Art. 56). As terras loteadas são de propriedade individual e nem a assembleia nem o comissariado ejidal podem dispor delas sem o consentimento por escrito dos(as) titulares (Art. 77). Para a atribuição dos direitos de terra, a ordem de preferência é: 1) possuidores reconhecidos pela assembléia, 2) ejidatarios(as) e vizinhos(as) do núcleo populacional cuja dedicação e melhoria são notórias, 3) filhos de ejidatarios(as) e vizinhos(as) que trabalham a terra há dois ou mais anos, 4) outros indivíduos no julgamento da assembléia (Art. 57). Uma vez que as parcelas tenham sido cedidas, a fim de assumir a plena propriedade das parcelas, os(as) titulares devem retirar seu registro do Registro Nacional Agrário e registrá-las no Registro Público de Imóveis (Art. 82). Além das terras loteadas, dentro do ejido existem as terras de assentamento humano onde se realiza a vida comunitária e aquelas de uso comum.
Os bens ejidales e comunais podem ser expropriados por razões de utilidade pública, conforme detalhado no artigo 93 da Lei Agrária.
Direitos coletivos à terra
Em 1992, a reforma do artigo 27 da Constituição alterou o caráter dos direitos coletivos praticados nos ejidos e nas comunidades agrícolas. A reforma foi motivada pelas condições de marginalidade e pobreza no setor rural causadas, entre outras razões, pela politização da distribuição agrária, pela falta de capacidade de controle das autoridades em relação à distribuição de terras dentro dos ejidos, pelos processos burocráticos que dificultam o acesso dos jovens à terra, pelas repetidas crises econômicas e progresso tecnológico, e pela chegada limitada de subsídios ao campo. Até então, a função social do ejido e das terras comunais lhes havia conferido um caráter jurídico de inalienáveis, intransferíveis, imprescritíveis, impraticáveis e indivisíveis. Entretanto, a reforma de 1992 permite a alienação dessas terras, favorecendo sua privatização e mercantilização (referência 2019).
Além do que diz a lei, a formalização dos direitos de terra comunitária em ejidos e comunidades agrárias tem dependido mais de questões práticas e interesses privados do que de questões de justiça social. De acordo com um estudo realizado em Yucatán entre 1994 e 1999, devido à falta de capacidade das delegações da Procuraduría Agrária para alcançar as metas do programa Procede, visando a emissão de títulos de terra para ejidatarios(as) e comuneros(as)e delimitando os limites dos núcleos agrários, as assembleias decidiram manter as terras sem parcelamento formal e só aceitaram a certificação das terras como um todo [18]. Atualmente, porém, as terras de uso comum são vendidas a empresários(as) nacionais, mas fora dos ejidos, pelas assembléias ejidais aconselhadas por visitantes agrários, que são acusados de interromper os procedimentos legais a fim de privatizar as terras [19]. Há numerosas queixas de ejidatariose organizações indígenas acusando delegados e visitantes agrários de terem favorecido o processo de desapropriação de terras de agricultores(as) indígenas e camponeses(as). Estes intermediários oferecem conselhos e informações, favorecendo um exercício individualizado da propriedade do ejido que não leva em conta as decisões da assembleia geral, enquanto fortalece a autoridade dos comissários de ejido e torna possível a alienação [20]. Segundo o estudo, algumas das estratégias utilizadas que resultaram na desapropriação de terras são: a simplificação dos procedimentos de compra e venda de terras de ejido, concentrando-os em uma assembléia quando deveriam ser realizados em várias, a realização de assembléias em regiões indígenas sem tradutor, minutas em branco que os comissários de ejido fazem assinar os(as) membros do ejido para serem usadas posteriormente para endossar alienações de terras sem o consentimento da assembléia, ou a demissão de autoridades agrárias que se opõem a projetos de desenvolvimento promovidos por investidores estrangeiros. Desta forma, os interesses privados dos ejidatarios são priorizados em detrimento dos direitos coletivos.
A Constituição também reconhece os direitos coletivos dos povos indígenas com direito à autodeterminação (Art. 2). Como a Constituição indica, os direitos dos povos indígenas são regulamentados pela legislação federal. Alguns autores apontam a impossibilidade legal dos povos indígenas de exercerem seus direitos diretamente, pois o artigo 2 da Constituição os(as) define como "entidades de interesse público", o que anularia seu caráter de "sujeitos de direito" [21]. Também apontam que em nível federal não há registro, cadastro ou outro instrumento oficial que delimite os territórios indígenas, o que impede e demonstra a falta de aplicação adequada dos direitos coletivos dos povos indígenas [22].
EZLN Celebração do Congresso Nacional Indígena 2016. Foto: Mariana Osornio (CC BY-SA 4.0)
Tendências de uso do solo
A governança descentralizada da terra determina em grande parte as decisões de uso do solo no país. Em particular, a capacidade de ejidos e comunidades de tomar decisões sobre o uso de suas terras, e o fato de ocuparem metade do país, fazem deles atores altamente influentes neste sentido. Além de ejidos, um estudo argumenta que, devido aos orçamentos limitados alocados às agências estaduais, os governos federais também desempenham um papel fundamental ao afetar a dinâmica da mudança do uso da terra através de programas de subsídios agrícolas e pagamentos por serviços ambientais [23].
Nos ejidos, a terra pode ser usada de cinco maneiras diferentes: cultivo (parcelas individuais); terra de uso comum (bosques, florestas e selvas); terra alocada por decisão da assembléia para necessidades comunitárias como educação (parcelas escolares); atividade produtiva para mulheres (fazendas agrícolas ou industriais rurais para mulheres) e para o treinamento de jovens (parcelas para jovens); parcelas para o ejido ou para uso comum (poços, currais, viveiros, etc.); e áreas para assentamentos humanos [24]. Entretanto, não é comum encontrar parcelas de escola ou de jovens em ejidosna prática. Geralmente, os(as) titulares de direitos administram as terras agrícolas dentro dos ejidos em um nível individual. As florestas, no entanto, são de propriedade comunitária.
Historicamente, a política florestal no México tem oscilado entre a limitação do controle local das florestas através de concessões florestais e a transferência de poderes de manejo florestal para ejidos e comunidades agrárias com cobertura florestal [25]. Na prática, de acordo com a Global Forest Watch, de 2000 a 2021 o México teve um declínio de 8,4% na cobertura arbórea [26]. Os dados do Banco Mundial de 2020 indicam que, em nível nacional, as áreas florestais representam 33% da área total, seguindo uma tendência para a diminuição (em 1990, representava 36%) [27]. Os principais motores do desmatamento no México incluem mudanças no uso do solo para agricultura e pecuária (82%), extração ilegal de madeira (8%) e incêndios florestais e doenças (6%) [28]. O aumento de mais de 400% no preço do óleo de palma entre 2000 e 2011, e o aumento no preço por cabeça de gado, explicam em parte a extensão das fronteiras agrícolas e pecuárias [29]. Em 2017, o México produziu 873,5 mil toneladas de óleo de palma cultivadas em uma área de 65.805 hectares. Chiapas foi responsável por mais da metade desta produção (57%) [30].
Las Nubes, Chiapas, Mexico. Foto: Moisés Vazquez (Licença Unsplash)
Entre 70% e 80% das terras florestais no México estão em comunidades agrárias e ejidos e, portanto, são manejadas coletivamente [31]. Um estudo sobre o manejo florestal comunitário no México aponta vários aspectos que influenciam o impacto do manejo florestal comunitário na conservação das florestas [32]. Estes incluem direitos comunitários e incentivos para cuidar das florestas. Comunidades com maior controle sobre a produção e autonomia no manejo florestal tendem a investir mais na proteção e conservação das florestas. Isto está relacionado ao desenvolvimento de uma economia florestal comunitária, o que influencia o valor social colocado nas florestas e, portanto, os incentivos para cuidar delas. Por outro lado, em condições de extrema pobreza, a ausência de opções econômicas para o uso das florestas reduz o valor social dado às mesmas, aumentando sua vulnerabilidade [33]. O mesmo estudo indica que as atividades de conservação florestal comunitária são particularmente prevalecentes em comunidades agrárias com identidade indígena.
Alguns autores(as) apontam contradições fundamentais entre políticas agrícolas e ambientais que levam a programas federais contraditórios que buscam melhorar a produção por um lado e proteger as florestas por outro [34]. O país expressou sua preocupação com o meio ambiente na Lei Geral sobre Mudança Climática, aprovada em 2012, e na publicação um ano depois de sua Visão Estratégica Nacional sobre Mudança Climática 10-20-40 para 2050. A lei promove o uso sustentável da terra e a reconversão de terras agrícolas degradadas em áreas de conservação ecológica [35]. Em um nível prático, as ações de mitigação da mudança climática incluem o manejo de terras agrícolas e práticas agrícolas, reduzindo a conversão de florestas em agricultura ou pastagens, e projetos REDD+ (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal, incluindo conservação florestal, manejo sustentável de florestas com participação local e aumento dos estoques de carbono florestal) [36], embora o programa não tenha sido claramente implementado. Com o objetivo de preservar a biodiversidade do México, cerca de 908.000 km2 foram declarados como Áreas Naturais Protegidas federais administradas pela Comissão Nacional de Áreas Naturais Protegidas (CONANP - sigla em espanhol) [37].
O governo também promove o desenvolvimento de baixas emissões (DBE - sigla em espanhol) como estratégias de uso do solo, mas sua implementação é complexa devido a contradições políticas, diferentes níveis de tomada de decisão e implementação desigual da estrutura legal devido a conflitos de interesse, corrupção e capacidade institucional insuficiente [38]. Isto levou a favorecer determinados usos do solo em detrimento de outros, como aconteceu com a mineração quando foi declarada de "interesse público", posteriormente com outros usos associados ao setor energético em relação à conservação [39], e com a conversão de terras rurais em terras urbanas devido ao crescimento populacional nas cidades e à necessidade de moradia. De fato, entre 1998 e 2016, 53% da expansão urbana foi realizada em terras de ejido ou comunais [40].
De acordo com os dados de 2018, 55% das terras no México são agrícolas. Esta porcentagem representa um aumento de três pontos em quatro anos [41], A Pesquisa Agrícola Nacional de 2019 estima que o número de unidades de produção que realizam a agricultura de campo aberto das culturas de interesse é de 3.510.381[42] A pesquisa fornece dados sobre a maioria das culturas de acordo com a área semeada. Trigo (97,6%), arroz (91,4%), cana de açúcar (69,3%), milho amarelo (67,6%) e milho branco (55,2%) são cultivados principalmente em parcelas maiores de 5 hectares. O estado onde a maior parte do trigo é cultivada é Sonora, seguido por Baja California e Sinaloa [43]. Em termos de emprego, estima-se que cerca de 12% da população economicamente ativa trabalha no setor agrícola [44].
Com relação ao gado, de acordo com a Pesquisa Agrícola Nacional, estima-se que 1.097.930 unidades de produção são dedicadas à criação e exploração de gado. Destes, 8,4% obtiveram crédito ou empréstimos [45].
Em 2010, a área urbana no México ocupou 102.418 km2 (não há mais dados atualizados disponíveis) [46]. Segundo dados de 2021, a área metropolitana cobre todo o território nacional e inclui 417 municípios e 74 áreas metropolitanas onde reside 62,8% da população [47]. O processo de urbanização nos últimos anos tem se caracterizado pela concentração da população em algumas cidades, resultando no fato de que em 2005 mais de 63% da população vivia em apenas 550 das 15.000 localidades existentes, enquanto quase 99% das localidades tinham menos de 5.000 habitantes [48].
Investimentos e aquisições de terras
As tendências em investimentos e aquisições de terras no México têm sido paralelas às políticas que têm afetado os ejidos e as comunidades agrárias.
Desde as políticas de ajuste estrutural resultantes da crise macroeconômica de 1982 [49] e as reformas de 1992 que facilitaram a privatização das terras de ejido, as políticas agrárias têm promovido uma visão agroindustrial para o desenvolvimento rural financiando de forma desproporcional, segundo alguns autores(as), os produtores mais ricos e reduzindo verbas para programas que buscam melhorar a governança florestal local [50]. Esta tendência foi estabelecida apesar da Estratégia Nacional REDD+ que procura fortalecer a governança local em áreas rurais.
Entretanto, no setor agroindustrial, a concentração da terra é em grande parte sob a forma de arrendamentos (entre 28% e 50%, dependendo da fonte) [51]. Outra característica do agronegócio no México é que, ao invés de possuir grandes extensões de terra, o controle é exercido na cadeia produtiva, estabelecendo contratos com pequenos(as) produtores(as), especialmente para cultivos como milho, cana-de-açúcar, café, frutas, vegetais, cevada e produtos lácteos [52].
Nos últimos anos, o agronegócio no sudeste do México tem sido em grande parte responsabilidade das comunidades menonitas - cristãos ortodoxos germânicos que chegaram ao país no início do século 20 a convite do Presidente Álvaro Obregón, que lhes concedeu terras - que são consideradas como os principais proprietários fundiários [53]. Apesar de sua tradicional rejeição à tecnologia, os(as) menonitas usam agora maquinaria pesada para aumentar suas plantações de soja, milho e sorgo. Um dos estados mais afetados por esta agricultura extensiva é o Campeche, o que explica em parte porque o Campeche sofreu o maior desmatamento em 2016, perdendo 54.700 hectares de floresta (22% do total do país) [54].
A mineração é um dos setores que mais atrai investimentos no México. O investimento aumentou nos últimos anos, atingindo mais de 4 bilhões de dólares em 2021, um aumento de 16,8% em relação ao ano anterior [55]. A mineração tornou o México o principal produtor mundial de prata por mais de 10 anos e entre os 10 primeiros na produção de 17 minerais incluindo espatoflúor, celestita, wollastonite, zinco, sal, cobre e ouro. A mineração contribui com pouco mais de 3% para o produto interno bruto [56].
No nível legal, a mineração se beneficiado de um certo privilégio desde que a Lei de Mineração estabelece que a exploração, o aproveitamento e o benefício dos minerais são preferenciais em relação a qualquer outro uso da terra, a menos que uma lei federal estabeleça o contrário [57]. Isto obriga a ejidos a ceder suas terras para a extração de minerais e hidrocarbonetos. A reforma energética de 2013 também facilitou a desapropriação de terras para concessões de petróleo e hidrocarbonetos, declarando as terras com tais recursos como sendo de interesse público [58]. Recentemente, no entanto, prevaleceu o direito à consulta dos povos indígenas que vivem em uma área de mineração no estado de Puebla. Em fevereiro de 2022, e após sete anos de batalha legal, a Suprema Corte decidiu a favor de uma comunidade indígena em Tecoltemi, cancelando duas concessões de mineração planejadas em uma área de 14.229 hectares, porque o governo não consultou a comunidade antes, contrariando a Constituição e a Convenção 169 da Organização do Trabalho sobre os direitos dos povos indígenas [59].
Recentemente, os investimentos em mineração têm sido desacelerados a fim de aumentar o investimento na extração de lítio [60]. No momento, a fase de exploração está em andamento em 60 locais no México, para os quais foram orçados 2,7 milhões de dólares [61]. A falta de experiência do México na produção de lítio, e dependendo da avaliação das fases exploratórias, faria dele potencialmente um apelo ao investimento ou à nacionalização, como proposto pelo governo.
Direitos da mulher à terra
A Constituição mexicana reconhece mulheres e homens como iguais perante a lei (Art. 40). A Lei Agrária (1992) estabelece algumas disposições específicas para o desenvolvimento e a proteção da mulher rural. Por exemplo, possibilita que a assembleia reserve um lugar na melhor terra para a unidade agrícola industrial feminina (Art. 71). Também permite que as mulheres pertencentes a um núcleo agrário se organizem como uma Unidade Agrícola Industrial Feminina (Art. 108). E reconhece as mulheres como ejidatarias e detentoras de direitos de ejido (Art. 12), o que lhes permite ocupar cargos e ter voz e voto nas assembléias. No entanto, poucos ejidos são presididos por uma mulher. Em 2019, apenas 7,4% dos ejidos eram presididos por mulheres [62]. Nem a Constituição nem a Lei Agrária usam linguagem sensível ao gênero, o que dificulta o exercício dos direitos das mulheres, pois o uso da forma masculina não contribui para desmantelar costumes e práticas onde as mulheres têm que pedir permissão a seus pais, maridos ou tutores homens para ter acesso a empréstimos, procedimentos administrativos ou de tomada de decisão.
Além de não serem proprietárias e não participarem da tomada de decisões, um estudo sobre o manejo florestal no estado de Hidalgo mostra como a divisão do trabalho de acordo com os papéis de gênero também inibe a participação das mulheres [63]. Na comunidade estudada, San Pedrito, há uma construção social da floresta como um espaço masculino. Isto implica que, na maioria dos casos, a produção e venda de madeira é realizada por homens, enquanto as mulheres são relegadas a atividades como poda, replantio ou produção de alimentos.
Em relação ao acesso à terra, segundo dados do Registro Nacional Agrário em 2019, apenas 25,9% das pessoas que possuem um certificado de terra que as credencia como ejidatárias ou comuneras são mulheres [64]. Os dados sobre a propriedade da terra das mulheres também variam de acordo com o estado. Na Cidade do México, Baja California, Guerrero e Sonora ultrapassa 30%, enquanto em Yucatan, Campeche e Quintana Roo é inferior a 20% [65]. A falta de títulos de terra impediu o acesso das mulheres ao apoio ao setor agrícola [66], apesar de serem grandes contribuintes para a produção de alimentos no México. Para resolver este problema, o governo mexicano implementou programas que não exigem que as mulheres sejam ejidatárias ou proprietárias para ter acesso a elas. Por exemplo, o programa Sembrando Vida (Semeando Vida) beneficiou 31% das mulheres e Producción para el Bienestar (Produção para o Bem-Estar) dedicou 27,8% dos recursos em 2019 às mulheres produtoras agrícolas [67].
Alguns estudos mostram que a criação de cooperativas de mulheres agricultoras é crucial para capacitar e empoderar as mulheres, especialmente em contextos onde a implementação de políticas é fraca [68].
Para saber mais
Sugestões da autora para leituras adicionais
Ejidos e comunidades agrárias no México foram transformados ao longo do tempo de maneiras que não estão refletidas na legislação. O artigo Ejidos/Comunidades analisa os novos usos, significados e valores ligados a estas formas de propriedade da terra onde a agricultura muitas vezes não é mais a atividade principal [69].
Apesar da legislação e dos mecanismos existentes no México para garantir os direitos dos povos indígenas, dos ejidos e das comunidades agrárias sobre suas terras e territórios, sua implementação e funcionamento nem sempre produzem os resultados esperados. O Informe sobre la jurisdicción agraria y los derechos humanos de los pueblos indígenas y campesinos en México (Relatório sobre a Jurisdição Agrária e os Direitos Humanos dos Povos e Camponeses Indígenas no México), publicado em 2018 pelo DPLF, fornece um relato sobre isso [70].
O México, como muitos outros países do mundo, está cada vez mais consciente da necessidade de assumir compromissos contra a mudança climática. Um dos desafios é como incluir tais compromissos na política e estrutura institucional existente sem criar contradições entre as políticas e considerando as interações em nível nacional e internacional. O Los nuevos arreglos institucionales sobre gobernanza ambiental y cambio climático en México (Estudo Os Novos Acordos Institucionais sobre Governança Ambiental e Mudança Climática no México), publicado em 2017, analisa os problemas de integração da governança ambiental nas estruturas institucionais neste país e reflete sobre as condições para uma governança ambiental efetiva [71].
Precisamente um dos desafios da governança ambiental são os conflitos e os danos gerados pela criação de áreas naturais protegidas em territórios já habitados. O artigo Campesinos sin resolución agraria: la difícil construcción de la gobernanza ambiental en un área natural protegida de Chiapas (Camponeses sem resolução agrária: a difícil construção da gobernanza ambiental em uma área natural protegida de Chiapas), México, apresenta um exemplo das contradições entre políticas de conservação e políticas agrárias, gerando processos de marginalização e exclusão contrários a ambas [72]. A proteção ambiental e o desenvolvimento sustentável andam de mãos dadas. O relatório Gobernanza de la Tierra y los Objetivos de Desarrollo Sustentable en México (Governança da Terra e as Metas de Desenvolvimento Sustentável no México), publicado por várias organizações não governamentais em 2021, fornece uma análise de como a implementação das Metas de Desenvolvimento Sustentável afeta os ejidos e particularmente as mulheres [73].
Linha do tempo - marcos na governança da terra
1910-1920 - Revolução Mexicana
A origem da Revolução Mexicana estava relacionada à demarcação e divisão de terras indígenas comunitárias, conhecidas como ejidos. A autorização do governo de Porfirio Diaz para tornar estas terras parceláveis em 1890 foi o início de uma política de terras em favor dos grandes proprietários(as), o que levou a que em 1910, 1% das famílias mexicanas possuíam cerca de 85% da terra. Os líderes revolucionários Pancho Villa e Emiliano Zapata deram fim à ditadura de Diaz após 35 anos no governo sob o lema "Terra e Liberdade" e "a terra é para aqueles(as) que a trabalham".
1917 - Reforma Agrária
A distribuição de terras sob a forma de ejidos e comunidades começou já em 1910. Em 1917, a restituição da terra foi estabelecida. Em sua primeira etapa, a reforma foi entendida como um ato de justiça social em benefício dos(as) camponeses(as). Mais tarde, a reforma foi vista como parte do desenvolvimento econômico nacional.
1934 - Criação do Código Agrário
O Código Agrário formaliza o reconhecimento e a confirmação das comunidades de fato, dando-lhes segurança jurídica sobre seus bens.
Anos 50 - Concessões florestais privadas
Nesses anos, muitas das florestas comunitárias foram inicialmente concedidas a empresas privadas - mas nos anos 70 se tornariam propriedade do governo - para exploração. Isto levou as comunidades a perderem seus direitos à terra florestal.
Década de 1980 - Medidas de ajuste estrutural
As medidas de ajuste estrutural econômico implementadas no México nos anos 80 levaram ao fechamento das empresas para-estatais que controlavam as florestas, permitindo que as comunidades recuperassem o controle das mesmas. Este direito foi legalmente recuperado através da Lei Florestal de 1986, que proibiu as concessões florestais e concedeu às comunidades o direito de consulta sobre qualquer projeto que pudesse ameaçar seus direitos de propriedade.
1992 - Reforma Agrária
Em 1992, o Artigo 27 da Constituição foi reformado com o objetivo de acabar com a distribuição de terras iniciada em 1915 e liberalizar as terras dotadas ou restituídas como ejidos e comunidades, que até então eram consideradas inalienáveis. No mesmo ano, foi criada a Lei Agrária sobre o ejido e a comunidade como regimes de propriedade social.
1994 - Sublevação Zapatista em Chiapas
Em 1994, os indígenas de Chiapas organizados no Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), liderados pelo Subcomandante Marcos, se levantaram exigindo a propriedade de terras retiradas dos povos indígenas como parte de uma maior demanda por equidade e participação política indígena na organização do Estado mexicano. O governo respondeu enviando suas forças armadas para acabar com a rebelião, levando a um conflito que terminou com a assinatura dos Acordos de San Andrés em 1996.
2001 - Progresso no reconhecimento dos direitos indígenas
Em março de 2001, uma marcha indígena deixou Chiapas para a Cidade do México, liderada pelo Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), exigindo ser reconhecidos(as) tanto como mexicanos(as) quanto como indígenas [74]. Nesse mesmo ano, o Artigo 2 da Constituição foi reformado para reconhecer a Nação com "uma composição pluricultural originalmente sustentada por seus povos indígenas, que são aqueles descendentes de populações que habitavam o território atual do país no início da colonização e que conservam suas próprias instituições sociais, econômicas, culturais e políticas, ou parte delas" [75].