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News & Events MP da regularização fundiária um assalto ao território em diversas frentes
MP da regularização fundiária um assalto ao território em diversas frentes
MP da regularização fundiária um assalto ao território em diversas frentes

O que está sendo vendido como tentativa de desburocratização e aumento da eficiência na gestão do patrimônio público, na prática esconde a possibilidade de transferência desse patrimônio e de recursos naturais sem qualquer critério de interesse social ou coletivo

No final do ano passado, o governo editou a Medida Provisória MP 759/16, supostamente com objetivo de facilitar a regularização fundiária de terras urbanas e rurais. As análises da questão urbana e rural da MP, entretanto, mostram que, por trás dessa proposta, há uma tentativa de mercantilização das terras ocupadas por assentamentos da reforma agrária e dos assentamentos informais urbanos, anistia às ocupações irregulares de alto padrão, além da venda, sem qualquer critério de interesse social ou coletivo, de imóveis patrimônio da União.

A mídia hegemônica e entidades como Irib (Instituto do Registro Imobiliário do Brasil), CAU (Conselho de Arquitetura e Urbanismo) e Confederação Nacional de Municípios reproduziram o discurso oficial, aparentemente repetindo informações divulgadas pelo Ministério das Cidades, e festejando a MP. Movimentos sociais do campo e da cidade, entretanto, começam a apresentar sua contra-narrativa, algo fundamental uma vez que os reais objetivos e consequências da adoção dessa Medida Provisória não constam claramente do discurso oficial.

O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), por exemplo, já se posicionou contrariamente à Medida Provisória por meio da Carta de Fortaleza, divulgada no final de janeiro, na qual denuncia a privatização das terras destinadas à reforma agrária. O movimento se posicionou sobre a questão da seguinte forma: “Somos contrários e combateremos a Medida Provisória n. 759 do retrocesso da Reforma Agrária, que privatiza as terras destinadas à reforma agrária, transformando-as em mercadoria, legaliza os grileiros de terras públicas e exclui as trabalhadoras e os trabalhadores acampados do processo de assentamentos”. O MST também denuncia “a privatização das terras, disfarçada de titulação”, em alusão à proposta da MP de titulação individual, por meio da transferência da propriedade, e a possibilidade de venda das terras dos assentamentos. Considerando a atual situação econômica e a capacidade de endividamento dos assentados, a venda será inevitável, uma vez aberta essa possibilidade, frente à pressão econômica imposta pela expansão do agronegócio.

No último dia 1º, foi realizado o debate “Regularização fundiária no Brasil o que está em jogo?” realizado pelo IAB (Instituto de Arquitetos do Brasil e pelo IBDU (Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico) com apoio do Instituto Pólis, no qual ficou evidenciado que a MP visa atacar a questão fundiária no Brasil em diversas frentes.

A COMPLEXIDADE E A AMPLITUDE DAS QUESTÕES EM JOGO VÃO MUITO ALÉM DE PRETENSÕES DE FACILITAR A REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DE ASSENTAMENTOS URBANOS INFORMAIS E ASSENTAMENTOS DA REFORMA AGRÁRIA

Mostrou-se que há um claro intuito de privatização das terras públicas da União. Tendo como justificativa a necessidade de aumento da arrecadação, sem obedecer a critérios de interesse social ou coletivo e ignorando o princípio da função social da propriedade, que deve orientar a política fundiária do governo, a proposta da MP visa expressamente instituir mecanismos para aprimorar a eficiência dos procedimentos de alienação de imóveis da União. Nesse caso, o que está sendo vendido como tentativa de desburocratização e aumento da eficiência na gestão do patrimônio público, na prática esconde a possibilidade de transferência desse patrimônio e de recursos naturais sem qualquer critério de interesse social ou coletivo, na medida em que o governo terá carta branca para alienar esses imóveis. Um efeito perverso dessa possibilidade de alienação sem qualquer critério será, por exemplo, a legalização da grilagem de terras públicas, inclusive na Amazônia Legal, representando uma séria ameaça ao patrimônio ambiental brasileiro e aos modos de vida tradicionais.

Outro ponto debatido é a intenção de disponibilizar para o mercado terras ocupadas atualmente por população de baixa renda nas cidades e de assentamentos da reforma agrária no campo. Além da titulação individual das terras da reforma agrária, a MP, no meio urbano, revoga a Lei n. 11.977/09, que estabelece princípios que orientam a regularização fundiária, definida até a edição dessa Medida Provisória, por um conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais para transformá-la, prioritariamente, em um processo de titulação em massa, que tem como intuito não a moradia adequada, mas a mercantilização da terra urbana.

Outra questão central dessa Medida Provisória é que ela prioriza a regularização fundiária de ocupações de alto padrão, como condomínios fechados e loteamentos em áreas de preservação ambiental, sem qualquer contrapartida. Com a conversão da MP em lei, por exemplo, condomínios fechados, que na realidade foram aprovados como loteamento e, portanto, deveriam disponibilizar suas ruas e praças para o uso público serão regularizados sem qualquer contrapartida, o que significará a privatização dos espaços públicos, de que todos poderiam desfrutar, resultando ainda em maior segregação socioterritorial nas cidades.

É por tudo isso que nesta semana, foi lançada por um coletivo de entidades e pessoas a carta “Medida Provisória nº 759/2016: A desconstrução da Regularização Fundiária no Brasil”, que sistematiza os principais problemas da MP debatidos no evento mencionado. A carta aponta a complexidade dos temas reunidos nessa proposta de lei e a amplitude das questões em jogo, que vão muito além de pretensões de facilitar a regularização fundiária de assentamentos urbanos informais e assentamentos da reforma agrária. A MP n.  759/2016 representa um assalto em diversas frentes ao território brasileiro, pois aprofunda o processo de privatização do Brasil e impede o acesso democrático à terra nas cidades, no campo e na Amazônia Legal.