Foto: Felipe Warnack/Creative Commons
No último 25 de maio, o novo Código Florestal (CF) completou dez anos [1]. Uma das principais contribuições deste marco regulatório foi a implementação de um novo instrumento de regulamentação do acesso e uso da terra dos proprietários rurais: o Cadastro Ambiental Rural (CAR). De acordo com o novo CF, o CAR deveria ser instituído pelos estados, em parceria com o Governo Federal, desenhando os passos até a recomposição das áreas desmatadas ilegalmente em propriedades privadas.
Atualmente, somente 28,6 mil dos 6,5 milhões de imóveis cadastrados foram analisados, segundo dados do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), ou seja, menos de 0,5% dos imóveis. Quando se observa os números sobre a fase de adesão ao Programa de Regularização Ambiental, nota-se que 52% dos 6,5 milhões de cadastrados já pediram para aderir à regularização ambiental, contudo, somente 1.169 termos de compromissos foram assinados, o que equivale a 0,01% dos imóveis cadastrados [2].
Segundo a Folha [3], a lentidão piorou após os decretos 10.622/21 e o 10.827/21, instituídos pelo Ministério da Agricultura. Isso porque, com os novos decretos, a diretoria de tecnologia de informação do SFB deixou de operar com foco na administração do CAR, passando a responder demandas de todo o Ministério, o que resultou na sobrecarga e instabilidades no sistema. Ademais, a ferramenta para análise dinamizada, a qual possibilita a autonomização da avaliação dos cadastros por meio de georreferenciamento, está paralisada desde março. De acordo com técnicos do Sistema de Cadastro Ambiental Rural (SICAR), se nada for feito sobre o assunto, há o risco de colapso do sistema de gestão dos cadastros.
Enquanto a principal ferramenta do Código Florestal sofre entraves, o Congresso recebe novas tentativas de flexibilização na legislação sobre o tema. Na Câmara, há cerca de 90 projetos de lei em tramitação com este objetivo. No Senado, dois projetos já possuem relatório favorável para votação pela Comissão de Agricultura. Um deles, de autoria do senador Irajá (PSD-TO) propõe mudar o ponto mais polêmico do CF: o da anistia a desmatamento ilegal em imóveis rurais. Segundo a lei de 2012, o ano-limite para que o imóvel negocie a regularização ambiental, sem sofrer punição, é 2008, o senador almeja aumentar este prazo para 2012.
Na opinião do consultor sênior de direito socioambiental do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), André Lima, o Código Florestal precisa avançar no sentido da implementação, e não da alteração da lei: "É preciso cancelar imediatamente os cadastros de imóveis sobrepostos com terras indígenas, unidades de conservação e florestas públicas, para retirar qualquer expectativa de direito à regularização fundiária nessas áreas cujas leis impedem regularização", aponta Lima. O consultor também propõe que o CAR seja utilizado para responsabilizar os infratores ambientais, "tal qual opera hoje de forma ágil e eficaz o sistema de responsabilização de infratores de trânsito", compara.
O resultado para este cenário é que a falta de efetividade do cadastro abre um gargalo no programa de regularização ambiental. A redução das multas aplicadas nos últimos anos é um exemplo do sentido da política ambiental brasileira, cujo sucateamento e impunidade são as realidades mais visíveis no momento.
Referências
1 - BRASIL. Lei no 12.651, de 25 de maio de 2012. Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa. Disponível em: Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa. Acesso em 30 de maio de 2022.
2 - CHIVARI, J; LOPES, C; NARDI, J. Onde estamos na implementação do código florestal? Climate Policy Initiative, 07 de dezembro de 2021. Disponível em: https://www.climatepolicyinitiative.org/pt-br/publication/onde- estamos-na-implementacao-do-codigo-florestal-radiografia-do-car-e-do-pra-nos-estados-brasileiros-edicao- 2021/#:~:text=A%20grande%20novidade%20de%202021,pilotos%20no%20Amap%C3%A1%20e%20Paran%C3%A1. Acesso em 30 de maio de 2022.
3 - AMARAL, A. Após dez anos de Código Florestal, 0.01% dos imóveis rurais aderem à regularização. Folha de S. Paulo, 24 de maio de 2022. Disponível em 30 de maio de 2022.
Esta matéria foi originalmente publicada em IGTNews No. 49